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Crônicas que contam histórias de Campos do Jordão.

 

Macarrão com molho de frango ensopado é bom? 


Macarrão com molho de frango ensopado é bom?

A querida Vó Marcelina Godoy ou Vó Marcela, razão desta crônica.

 

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Pode ter certeza: macarrão com molho de frango ensopado é uma das comidas mais deliciosas do mundo.

Faço essa afirmativa e justifico este meu posicionamento.

Certa época de minha vida, com certeza absoluta, na década de cinqüenta, fui um freqüentador assíduo da Fazenda Lagoinha, de propriedade da família Reis Magalhães, da cidade de São Paulo, da qual fazia parte o saudoso Dr. Paulo Reis Magalhães que tive a oportunidade de conhecer quase três décadas depois e manter um excelente relacionamento amigável e profissional envolvendo assuntos relativos à energia elétrica fornecida á Fazenda Lagoinha pela CESP – Companhia Energética da São Paulo (da qual fui gerente local por quase duas décadas), por força de um contrato bastante antigo, envolvendo a sua gratuidade condicionada, em troca de uma área privilegiada cedida pelo mesmo, onde estava sediada a nossa Colônia de Férias do Fojo. Essa Fazenda está situada no bairro cujo nome Lagoinha acabou por prestigiar e perpetuar a importância da famosa Fazenda do primórdio de Campos do Jordão.

Essa Fazenda, além de suas pequenas lagoas utilizadas para a criação de carpas, de seus pomares de pêras diversas e de seu gado leiteiro, mantinha uma enorme e maravilhosa criação de carneiros e ovelhas.

A finalidade dessa criação era o aproveitamento da sua preciosa e disputada lã para a confecção de fios diversos, beneficiados nos teares manuais, para serem, posteriormente, transformados habilmente, artesanalmente, em lindas e aconchegantes cobertas, cobertores, cachecóis e meias, utilizados para amenizar o frio intenso de Campos do Jordão de outrora, especialmente durante as noites frígidas de inverno e nas manhãs hibernais, onde tudo ficava coberto por uma espessa camada de geada. Esses fios, também, eram transformados em outros tipos de tecidos utilizados para diversas finalidades.

Nessa época e muito tempo antes, os responsáveis por toda a administração, guarda, fiscalização, manutenção da criação e da plantação era a numerosa família chefiada pelos saudosos Dino de Godoy e Marcelina de Godoy, ou Marcela, como era mais conhecida, e seus diversos filhos que lá moravam em uma grande casa situada nas proximidades da casa dos patrões.

Era uma família maravilhosa, de dignos representantes da raça negra.

Meu pai e minha mãe, em virtude de terem sido padrinhos do casamento de uma das filhas do casal, a Justina, passaram a compadre e comadre do seo Dino e da D. Marcela.

Como sempre gostei do ambiente e das atividades desenvolvidas em sítios e fazendas, adorava aquele maravilhoso local, altamente privilegiado pela natureza, com suas paisagens espetaculares, adornadas pelos morros, rios e riachos murmurantes, fauna e flora.

Os filhos do casal, o Manoel (Neco), o Belisário (Bili), o Silvio, o Toninho, a Maria Tereza (Dega), a Marina e a Justina, todos nossos grandes e inesquecíveis amigos. Infelizmente, desses todos, hoje só resta a Maria Tereza, a Dega. Todos os demais já se encontram em outras fazendas de nosso imenso Universo celestial.

Todas as visitas que fiz à Fazenda Lagoinha e aos grandes amigos da família Godoy se tornaram inesquecíveis; porém, uma ficou fortemente gravada em minha mente e na história de minha vida.

Nessa visita, estando acompanhando minha mãe que foi passar a tarde com a comadre Marcela, enquanto conversavam e colocavam as notícias, casos e causos em dia, eu e alguns de seus filhos, com certeza com o Silvio e o Toninho que tinham idade mais próxima da minha, fomos andar a cavalo, tomar banho numa das lagoinhas, jogar bola, comer frutas, tomar leite tirado na hora, na última tirada da tarde; enfim, pintar e bordar, como se costumava dizer.

A tarde maravilhosa, infelizmente, estava acabando, o Sol já se havia escondido no horizonte. Logo no início da noite começou a chover.

Naquela época, devido a condições financeiras, a grande maioria das pessoas não tinha automóvel, como as pessoas de hoje. Nosso tradicional meio de locomoção era a pé, de charrete ou, em alguma oportunidade especial, de carro de praça, hoje chamado de táxi.

Devido à insistência da comadre Marcela e do compadre Dino, acabamos ficando mais um pouco. Lembro que falaram: “Esperem a chuva passar. Depois, telefonamos para um motorista e pedimos um carro de praça para vir buscá-los”.

No enorme fogão de taipa movido a lenha, as achas ardiam em chamas e aqueciam toda a cozinha. Não tenham dúvidas, lá era o local onde todos ficavam. Em cima da brilhante e cuidada chapa do fogão que demonstrava o carinho com que era mantida impecavelmente limpa, a chaleira d´água soltava fumaça pelo bico, demonstrando que já estava fervendo. Também o bule de café, de ágata verde, ali estava para quem quisesse tomar um golinho.

No fumeiro sobre o fogão, uma linda manta de toucinho carnudo e salgado ficava recebendo o calorzinho do fogão e um pouquinho da fumaça que acabava subindo e ia aos poucos ficando defumada.

Por alguns minutos, a D. Marcela se ausentou daquele local tão íntimo e agradável. Não demorou muito tempo e lá veio ela trazendo, numa das mãos, um enorme frango caipira já abatido. Imediatamente, colocou o seu enorme avental branco muito limpo e já pegou embaixo do fogão uma bacia de chapa de aço, colocou o frango dentro, pegou a chaleira de água quente e jogou o líquido fervente em cima do frango e logo começou a tirar-lhe as penas. Em pouco tempo o frango estava todinho depenado, mostrando sua pele amarelinha e maravilhosa que só os frangos criados soltos no quintal ou em terreiros, comendo capim, milho, ciscando pequenas pedrinhas e insetos, podem ter.

Também, em pouco tempo, o frango já estava eviscerado, limpo e devidamente cortado, com habilidade, em pedaços regulares.

Em seguida, descascou alguns dentes de alho, pegou o pilãozinho de madeira e socou-os com um pouco de sal e, magistralmente, temperou o frango, colocou-o numa panela de ferro que já havia anteriormente colocado num dos buracos da linda chapa de ferro do fogão, onde um pedaço daquele toucinho do fumeiro já havia derretido vagarosamente. Acrescentou alguns temperos, alguns ingredientes, como cebola e tomate batidos, e logo que começou a ferver, tampou um pouco a panela e já começou outra atividade. Foi até ao armário da cozinha e pegou um pacote de macarrão, marca MOEMA, daquele macarrão de pacote de papel azul, de aproximadamente 40 ou 50 centímetros de comprimento. Pegou uma panela maior, colocou mais água quente e esperou ferver.

Enquanto fazia tudo isso, com uma facilidade e habilidade indescritíveis, não deixava de manter a conversa em dia.

Ao verificar que o frango já estava cozido e ensopado, acrescentou umas duas colheres de extrato (massa) de tomate, muito usado antigamente, antes do aparecimento da infinidade de molhos de tomate já prontos, acondicionados em embalagens longa vida. Eram famosos os extratos de tomate marca Elefante da Cica, existentes até hoje, e o da marca Peixe. Deixou ferver um pouquinho mais e verificando que o molho estava no ponto certo e desejado; afastou um pouco a panela da chama forte do fogão, colocando-a em local mais apropriado. Acrescentou, por último, um bom punhado de cebolinha e salsinha bem picadas, que acabara de colher no canteiro da hortinha próxima à porta de entrada da cozinha.

Na panela com a água já fervente acrescentou um pouco de óleo e, tirando o macarrão do pacote, colocou-o nessa água, durante o tempo certo para o seu cozimento, sem deixá-lo muito ou pouco cozido.

Estando tudo de acordo com o esperado, pegou uma enorme travessa da louça branca e, aos poucos, foi colocando o macarrão já devidamente escorrido e, também aos poucos, os pedaços de frango, um pouco do molho, e foi mexendo com muito cuidado para que macarrão, molho e frango se integrassem acertadamente, e, finalmente, jogou por cima de tudo um belo punhado de queijo parmesão que a Dega acabara de ralar.

Enquanto isso, o seo Dino e a filha já haviam colocado, numa enorme mesa de madeira, os pratos e talheres em número certo, de acordo com os presentes.

Colocada a travessa na mesa, D. Marcela pediu a todos que se sentassem nos bancos de madeira em torno da mesa e, aos poucos, foi servindo cada um dos presentes.

Que momento inesquecível, grandioso e maravilhoso. Que privilégio eu ali sentado naquela mesa divina, acompanhado de maravilhosos e queridos amigos, saboreando aquele celestial macarrão com molho de frango ensopado, preparado por mãos hábeis, acostumadas aos trabalhos caseiros do dia-a-dia, e a fazer tudo com muito carinho, amor e dedicação.

Tudo isso, acrescentando o tempero da fome naquele início de noite, o barulho da chuva caindo no telhado e se precipitando no chão e na calçada de pedra do lado de fora, o calor emanado daquele aconchegante fogão à lenha, a presença de todos os amigos, num ambiente altamente familiar, a harmonia e a paz daquele local, nos dá a forte e verdadeira certeza de poder dizer com toda segurança: MACARRÃO COM MOLHO DE FRANGO ENSOPADO É MUITO BOM. É ÓTIMO. Além de muito bom, é inesquecível, especialmente considerando-se as condições em que ele foi degustado.

Hoje, somente lembranças e saudades daquela tarde maravilhosa.

Edmundo Ferreira da Rocha

15/07/2007

 

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