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Oscar Ribeiro de Godoy

 

A FAZENDA DA GUARDA (II)

 

Quadro "Fazenda da Guarda" - Autoria Camargo Freire

 

Minha mãe (1), que fora senhora de escravos, tinha invejável capacidade de mando e organização. Recebida a fazenda, após a penhora judicial, começaram-se os problemas e lutas para obter rendimento, o que era difícil na época. Mas o espírito empreendedor de Dona Sinhazinha a empurrava para frente em busca de meios e modos para obtenção de lucro e aquisição de recursos e reservas para viver e educar os dois filhos menores.

 

Começaram-se as tentativas. Iniciamos com a venda de bois erados, pois tínhamos muito gado vacum, e uma vez por ano retirávamos a boiada. Era um bom negócio. Vendíamos os animais na mangueira, e, para sair pelas trilhas e matas com o gado acostumado à vida livre, era necessário colocar em cada um deles os “paus de chifre”.

 

Cortavam-se paus de metro e meio e amarravam-se nos chifres com embiras ou cipó. Em parte, essa providência impedia a entrada no mato, o que tornava o serviço mais fácil. Quando o caminho atravessava as florestas, a boiada conservava-se na trilha, pois, na tentativa de fugir, os paus batiam nas árvores, causando dor na cabeça do animal que voltava incontinente para seu lugar na trilha. Vendíamos o gado para os Farias no Charco, e para compradores de Pinda e Guará.

 

No bairro denominado Paiol, numa das extremidades de nossa área, cedemos as terras para vários colonos que pagavam o arrendamento em espécie – milho ou feijão –, garantindo assim o consumo de todos, inclusive dos animais de trabalho. Recebíamos em média de 200 a 300 sacos de milho em palha e alguns sacos de feijão.

 

Também engordávamos os porcos e os vendíamos na Vila, entregando-os nos armazéns – os supermercados da época – já limpos, em duas bandas ou metades do animal. Todo o transporte era feito no lombo de burro e pelas trilhas das montanhas.

 

Não existindo açougue ou leiteria na cidade, começamos a tentar outro negócio. Construímos ao lado da sede um comprido rancho coberto de sapé que passou a chamar-se Rancho das Vacas. Às três horas da madrugada, começava o serviço dirigido pelo preto Eusébio, fiel servidor de muitos anos e muito amigo de umas “branquinhas”. Duas horas depois, todas as vacas estavam ordenhadas, e o leite era colocado em litros de vidro, previamente limpos de véspera. Eles eram postos em caixas de cerveja que levavam cada uma de 12 a 15 garrafas e, em seguida, essas caixas eram ajeitadas uma de cada lado da cangalha do burro. Dois rapazes, que se revezavam diariamente, partiam montados a cavalo no sobe e desce dos morros. Saíam cedo com os dois burros, que também se revezavam, levando as caixas de litros de leite e, na Vila, seguiam de porta em porta, fazendo a entrega.

 

Na volta, em conseqüência da péssima estrada, ao prestar as contas, sempre havia quebras de litros e, às vezes, acidentes mais graves. O leiteiro tinha por obrigação, na chegada, tratar dos animais. Havia um burro apelidado de Topázio que, de tanto realizar o trabalho diário, passou a conhecer a Vila, a casa dos fregueses e praticamente não precisava ser guiado, ia sozinho.

 

Hoje, tenho a impressão de que esse serviço era recebido com satisfação pelos compradores, pois eram freqüentes os pedidos, e chegamos, em algumas ocasiões, a encaminhar os dois burros com duas caixas cada um, mais ou menos sessenta litros de leite. Das sobras do leite, fazíamos manteiga e doce que eram distribuídos pelos leiteiros aos nossos fregueses. Não satisfeitos com a renda do leite, partimos para mais um empreendimento: a venda da carne retalhada.

 

(1) Maria da Glória Marcondes de Godoy, Sinhazinha. Ela era irmã de Alexandre Manuel (o engenheiro de que tratam os contos A estrada ligando a Guarda à Vila e A queda no rio Sapucaí), Manuel Alexandre, Francisco (Nenen), Frederica, Eulália (Pequenina), Risoleta, Trajano, Tarquínio (Tati) e Zenóbia.

 

 

 

 

 

 

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